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O ESPETÁCULO

Arigós, pássaros migratórios, foi o apelido dado aos soldados da borracha que nos anos da segunda grande guerra chegaram aos bandos em terras amazônicas. Não foram os primeiros, como eles, desde o final do século XIX, milhares de nordestinos migraram do sertão para floresta iludidos pela fortuna prometida advinda de uma árvore – Heveas Brasiliensis – a seringueira. Embora muitos exploradores e viajantes tivessem adentrado o território, então chamado de deserto demográfico, a despeito dos diversos povos originários que o habitavam, a exploração da borracha foi a primeira grande ferida aberta na Amazônia, construiu cidades e a riquezas de alguns, significou conflito, morte e miséria para tantos outros, esquecidos e apagados pela História.
Inspirados nos textos amazônicos de Euclides da Cunha e nas histórias e depoimentos de homens e mulheres ribeirinhos, descendentes dos arigós e que hoje são também povos da floresta, a Mundu Rodá adentra o universo amazônico no rasto da borracha. Em “Migração criativa”, que reflete o próprio trajeto realizado por esses migrantes, o espetáculo é para nós um deslocamento do universo cultural nordestino, com que temos trabalhado a 20 anos, rumo a Amazônia ainda desconhecida e imaginada.

Ficha Técnica

 

Concepção e atuação Alício Amaral e Juliana Pardo
Direção Antonio Salvador
Coordenação Dramatúrgica Luís Alberto de Abreu e Maria Thaís
Textos Murilo de Paula e Euclides da Cunha (excertos da obra A Margem da História)
Direção e Criação Musical Alício Amaral
Desenho de Luz Eduardo Albergaria
Cenário e Figurino Eliseu Weide

Assistência de Direção e Operação de Som Cibele Mateus
Operação de Luz e Cenotecnia Eduardo Albergaria

Pesquisa dramatúrgica Cia. Mundu Rodá, Luís Alberto de Abreu, Maria Thaís, Murilo de Paula e Antonio Salvador
Pesquisa Cenário e Figurino Cia. Mundu Rodá, Antonio Salvador e Eliseu Weide

Preparação/Investigação Narrativa Antonio Salvador

Preparação Corporal
Deuses que Dançam (Orixás) Wellington Campos e Alexandre Buda
Treinamento Funcional FIT360

 

Preparação Musical Charles Raszl e Zuza Gonçalves
Provocação/Investigação musical Charles Raszl, Zuza Gonçalves e Alício Amaral
Áudio em off (extração do látex e canção do seringueiro) cedido por Marlui Miranda

 

Arte Gráfica Lisiane Leite
Fotos Antonio Salvador, Cibele Mateus e Mariana Pardo
Registro Audiovisual Panamérica Filmes, Mariana Pardo e Cia. Mundu Rodá

Breve Contextualização

da Saga dos Soldados da Boracha 

 * ARIGÓS * 

Propagada durante décadas, a equivocada ideia de que a Amazônia era “uma terra sem homens para homens sem terra” – lema do governo ditatorial do Gal. Emílio Garrastazu Médici – justificou os diversos ciclos de exploração dos recursos naturais da região do Xingu e rio Iriri. Durante o que ficou conhecido como Segundo Ciclo da Borracha, o governo brasileiro se comprometeu com os EUA (Acordos de Washington) a produzir látex em larga escala para a indústria da guerra, suprindo a ausência desse recurso provocada pela tomada da Malásia pelos japoneses, em 1942. 

Assim, em 1943 foi criado o SEMTA, órgão sediado na cidade de Fortaleza, responsável pelo recrutamento compulsório de nordestinos que sofriam com as grandes secas, iludidos com a promessa de ganhos financeiros e de uma vida melhor. Após uma viagem de navio até Belém, esses nordestinos eram recebidos e selecionados por espécies de “empresários” que ganhavam do Estado o direito de administrar a produção dos seringais, também conhecidos como “patrões”. Da capital do Pará, os “arigós” subiam o rio Amazonas e adentravam no rio Xingu até o porto de Vitória do Xingu, a partir de onde seguiam mais 45 kms por terra, até a cidade de Altamira e, em uma última etapa da jornada, prosseguiam por longos dias até o alto rio Iriri. 

Quando chegava ao seringal, o “arigó” (seringueiro “brabo”) aprendia o trabalho com outro seringueiro mais experiente (“manso”). Juntos, partiam para “riscarem as madeiras”, em uma jornada diária que se iniciava por volta das quatro da manhã e se encerrava no cair da tarde. No local do trabalho também realizavam um processo conhecido como “defumação da borracha”, que transformava o látex líquido em uma espécie de bola mais rígida e permitia a pesagem e o posterior transporte para a cidade. Concluído o serviço, ainda deveriam pescar o peixe que, juntamente com a farinha, compunha sua alimentação deficiente. Na maioria das vezes, os seringueiros eram homens subnutridos devido ao enorme esforço físico associado à ingestão de baixa caloria.  

Embora os seringais fossem instituições comerciais, não se submetiam às normas vigentes do comércio da época. Era o sistema de aviamento que “regulava” as transações comerciais internas, pelo qual o seringueiro se endividava constantemente a fim de comprar alimentos, tralha de pesca e utensílios para o trabalho. A lógica era o de uma “caderneta” onde se anotavam as “dívidas” dos arigós, que seriam amortizadas frente à sua produção ao fim da safra. No entanto, o seringueiro não tinha o controle desses registros e quase nunca conseguia “saldar” essa dívida, que era arrolada para a safra seguinte e gerava um regime de trabalho verdadeiramente análogo ao da escravidão.

Somado a esse contexto de abandono, os “arigós” se viam constantemente envolvidos em disputas com os índios que antes viviam naquelas áreas e que sofreram um verdadeiro extermínio a partir desse processo de ocupação forçada. Em sinal de resistência, eram constantes as emboscadas e ataques contra os seringueiros e suas famílias; isso, por sua vez, detonava espécies de expedições, organizadas pelos “patrões” e lideradas por homens especializados na captura e extermínio desses povos, o que gerou a dizimação completa de várias etnias. 

Essa situação ganhou, em dado momento, tal proporção que impulsionou a criação do SPI (Serviço de Proteção ao Índio), hoje FUNAI (Fundação Nacional do Índio); o SPI promovia grandes expedições (ou frentes de atração), compostas por sertanistas, mateiros da região e indígenas já pacificados que adentravam na mata para estabelecer contato com etnias beligerantes e convencê-los a se mudarem para outras regiões mais afastadas dos seringais. Resultados desse processo são as TI (Terras Indígenas) e Parques Nacionais espalhados pelo norte do Brasil. 

Com o término da 2ª Guerra Mundial e a queda dos lucros do “negócio” o colapso econômico provocaria o abandono dos seringais pelos patrões e, consequentemente, o abandono também desses milhares de trabalhadores nordestinos na região. Ao contrário das promessas anunciadas durante o recrutamento, o governo federal nunca enviou os “arigós” de volta para casa e estima-se que, dos quase 60.000 homens que ali chegaram, apenas dez por cento conseguiram retornar por meios próprios. Os que ali permaneceram morreram ou se assentaram na região, absorvidos por outros modos de sobrevivência tão precarizados quanto o anterior, como a pesca, a caça da onça-pintada para a comercialização da pesca, garimpo etc.

TEXTO: Panamérica Filmes.

Diário de bordo - Cia. mundo Rodá

Projeto ARIGÓS

Amazônia Adentro

Vídeos Panamérica Filmes

Trechos do Documentário - "Histórias, Comunidades e o Rio"

INRC - Ofício de Seringueiro - Altamira, PA.

INRC - Massacre do Judas - Brasil Novo - PA.

ESTE projeto foi contemplado pela 3a edição do Prêmio Zé Renato de teatro para a cidade de são Paulo

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